ÂngeloCavalcante Economista, cientista político, doutorando na USP e
professor da Universidade Estadual de Goiás
27 de Novembro de 2017 - https://www.brasil247.com/pt/colunistas/angelocavalcante/329204/Racismo-como-religi%C3%A3o.htm
E essa da atriz Thaís Araújo de denunciar o racismo
brasileiro em um evento realizado em São Paulo? Onde já se viu isso? A também
atriz Marieta Severo entrou na onda e escancarou o racismo de todo o dia contra
seu neto, Francisco Brown; o que, por sinal, já fora, tempos atrás, feito pelo
seu ex-marido, o cantor e compositor Chico Buarque.
Faz pouco tempo que o ator Bruno Gagliasso havia
corajosamente "rasgado o verbo" contra o racismo desancado contra sua
filha adotiva, uma criança negra e que, segundo o mesmo, deu novo rumo e
sentido para sua vida.
Algo em torno de trinta mil jovens negros são
assassinados anualmente no Brasil. As policias, brigadas, guardas e batalhões
do país os executam aos montes, em série, em escala industrial e com a nobre
"certeza do dever cumprido". Para essa épica e ininterrupta limpeza
étnica são evidentemente, promovidos, recebem medalhas, patentes e ganhos
salariais. E tudo na nossa cara, com nosso aval, benevolência e vistas grossas.
Essa álgebra de sangue implica, vejamos, em algo
como oitenta e dois assassinatos ao dia; ou quase quatro mortes por hora. Não é
impressionante? Isso representa uma morte a cada quinze minutos.
Uau... Nem a Síria, Bagdá ou a Faixa de Gaza são
tão eficazes. Que Estados Unidos que nada... Nós somos os mestres, os senhores
da guerra do mundo! Nada se compara com o Brasil! NADA!
E não vai parar! Não tem porquê parar; nada indica,
aponta ou viceja que esse genocídio irá chegar a termo. É uma guerra de
civilizações. É que matar gente negra dá dinheiro... Muito dinheiro! Garante
poder, força, território e liderança.
Gente negra mete medo; sua religiosidade milenar de
fecunda interação com a natureza; que celebra a existência, a liberdade do ser
e que tudo fascina, promove e exulta; que confere centro e unidade para o corpo
e a mente entre danças, gingas e atabaques, não tem jeito, mobiliza todo o
chauvinismo brasileiro, ergue titãs fascistas neste "patropi"; elege
bancadas inteiras de senadores e deputados federais e que abertamente, bem
sabemos, cerram fileiras contra negros, gays, feministas e a juventude.
O racismo como definitiva instituição da própria
fundação brasileira conforma formas políticas; produz ajuntamentos, unidade e gera
discursos, evidentemente, de ódio, segregação e muita apartação.
É bom recordar que muito do ódio ao Lula (a palavra
é mesmo ódio!) é porque ele conseguiu incluir algumas minúsculas frações do
povo negro nos propalados cursos de medicina, nas engenharias, nos concursos
públicos e os afastou um pouco da senzala brasileira, ao fim, a principal
arquitetura simbólica e societária do país.
Uma das principais estratégias contra o genocídio
afro-brasileiro seria investir em políticas públicas civilizacionais como
moradia, acesso perene a saúde e a educação de qualidade, uma definitiva
política de segurança alimentar para todas as pessoas, enfim, esse movimento de
resgate do humano brasileiro como política de Estado e em operação, ao menos,
por cinquenta anos, poderia, talvez, estancar a sangria aberta a bala, quem
sabe pela fome, pelo desemprego ou pelo desespero puro e simples de nossa gente
negra.
Só não podemos esquecer do racismo nosso de cada
dia! Essa religião nacional, sutil e potente que respiramos, comemos, lemos,
vemos, assistimos, saboreamos, que nos faz, refaz e perfaz constantemente e
que, definitivamente, não nos dispensa em instante algum.
Ainda bem que temos William Waack, Merval Pereira,
Ali Kamel e Marco Antonio Villa a nos lembrar de que "racismo não
existe" nesta terra. Pura "invencice" de preto magoado. Ao
trabalho!
ÂNGELO CAVALCÂNTE
brasil247.com
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