19.11.07

“UM” OUTRO LÁ!
Folha da Região 21/11/2007


Alguns escritores amadores, aqueles que não conseguem editar um artigo no jornal, um livro, e humildemente, não se reconhecem como artista e nem sabem que escrever é pura arte, talvez a mais pura. Na verdade, o artista escritor é aquele político que se expõe e escancara a alma, sem medo ou pudor. Deixa aos bisbilhoteiros críticos, ou mesmo aos analistas literários, a porta do seu mundo particular aberta com a inscrição: “Entre sem bater, você não está sendo filmado”.

Existem, porém, os técnicos que escrevem manuais para uso de um equipamento, relatórios, lâminas informativas, projetos, normas sociais e enfim, todo tipo de literatura específica. Usam argumentos necessários para facilitar a utilização de um produto. O entendimento desses textos deve ser igual por todos os usuários, e isso não é arte.

Na crônica, na poesia, no conto e em tantas outras formas de comunicação, o escritor será sempre surpreendido por interpretações diferentes do que pensou e grafou. Quando abordado por um leitor que entendeu a minha escrita de uma forma diferente do que criei, a sensação me é agradável, descubro junto ao outro um pensamento que não me ocorreu. Para mim, essa outra visão é, antes de tudo, democrática.

Ao discordar de uma crítica em um artigo, e tentando “explicar o inexplicável” a um técnico que têm no imaginário a verdade final, fui agredido por pensar diferente.
─“(...), agora me vem ‘um’ outro lá (...)”, escreveu o endeusado.
Discordei das suas “verdades”, mas não deveria. A teoria fascista prega que devemos fazer apenas o que nos mandam, e calar. Essa bronca me levou a refletir: quem será?
E atônito, imaginei, o que esse tipo pensava naquela hora:
─ “Você sabe com quem está falando?”.

Quando um engenheiro faz um projeto, é possível provar, antes da obra pronta, que o objetivo será alcançado. No campo jurídico, o embasamento nos parágrafos das leis, vendando os olhos da Justiça, o entendimento é reto: Só pode haver um agressor havendo um agredido. Nas causas jurídicas, nos tribunais, algumas teses são obras literárias. A quantidade de peças teatrais e audiovisuais comprova que a história de cada julgamento, contem componentes emocionais de grande valor artístico.

Existem doutores que são artistas, e outros que escrevem, mas acostumados à leitura técnica, ingenuamente, acreditam nas notícias “plantadas” na mídia, e aí surge a opinião perfeita sobre o noticiário imperfeito. Perco-me na dúvida: Estaria eu lidando com uma personalidade doentia e reacionária, ou com uma alma técnica sem mácula? Eu não acredito em ingenuidade política, nela, até as lágrimas são planejadas.

Ventura Picasso – Coordenador do Grupo Experimental da AAL - 18/11/2007
2206.

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